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Fala povo. Esse é o segundo episódio da série de reportagens que tô escrevendo para um site. Espero que curtam. Caso não tenham lido, o link pro primeiro episódio tá no final do post. Comentem lá no site, se der. Valeu!
http://www.oplayer2.com.br/beyond-control-episodio-2-parasite-eve-e-o-imperio-mitocondrial/
Episódio 2: Parasite Eve e o Império Mitocondrial
Todo gamer que nasceu nos anos 80~90 e/ou é fanático por RPGs eletrônicos, pelo menos já ouviu falar de Parasite Eve, JRPGpara o finado Playstation 1. Não é muito difícil encontrar pessoas que se deram bem em provas de biologia graças a esse jogo, diga-se de passagem.
Lançado em 1998 com participação de Hideaki Sena no desenvolvimento, o jogo da Squaresoft (atual Square-Enix) impressionou a muitos, seja pela sua narrativa cinematográfica até então incomum em videogames, pela atmosfera densa e imersiva de um filme de terror, pela jogabilidade impecável e dificuldade elevada ou mesmo pelo seu principal elemento, o enredo focado nas mitocôndrias e o levantamento das sequintes questões: é possível as mitocôndrias se rebelarem contra os próprios seres vivos? É possível o surgimento de superpoderes e mutações por conta dessas organelas? Pode existir uma “Eve” (supermitocôndria)?
Capa do livro "Parasite Eve" e seu autor, Hideaki Sena
“Mas quem é Hideaki Sena?”, você deve estar se perguntando; ele é nada menos que o autor do Light Novel (livreto) de terrorParasite Eve, obra que inspirou o jogo de mesmo nome. Japonês nascido na privíncia de Shizuoka e hoje com seus 46 anos de idade, o escritor formado em farmácia resolveu juntar seus conhecimentos científicos à arte de escrever, resultando em um best seller que rendeu não apenas um jogo, como também já tinha uma representação nas telonas, em 1997.
Voltamos ao jogo: se passando alguns anos após os acontecimentos da obra original, Parasite Eve oferece ao jogador diversas informações e curiosidades sobre as mitocôndrias; algumas de conhecimento geral, outras tão surpreendentes que fizeram os fãs se apaixonarem pelo assunto.
Mas, será que todas as informações sobre essas organelas estão corretas? Corremos atrás da verdade e tiramos todas as dúvidas com a Profa. Dra. Paula Bresciani M. de Andrade, bioquímica especialista em mitocôndrias (acesse o material informativo indicado pela Dra. Clicando aqui e aqui).
As mitocôndrias são organelas com DNA próprio encontradas no interior das células. “Estão presentes em fungos, plantas eanimais e, provavelmente, se originam da associação endossimbiótica entre bactérias oxidativas e células procariotas glicolíticas.”, explica a Dra. Paula. A organela tem a importante função de realizar a respiração celular, que culmina nasíntese de ATP (adenina trifosfato). “A célula usa vários compostos como fonte de energia e, através de reações químicas, produz ATP. O ATP é um composto que pode ser usado para promover muitos dos processos fundamentais para a existência da célula. Sem ATP, a célula morre. A mitocondria possibilita produzir ATP com rendimento muito maior, aumentando enormemente a eficiência do aproveitamento das fontes de energia que a célula dispõe.” Resumindo: Sem mitocôndria -> temos um (grande) problema.
A doutora fala também de algumas curiosidades das mitocôndrias: elas estão presentes em quase todas as células (muscular,neuronal, cardíaca, hepática, adiposas e células beta), com exceção das hemácias (glóbulos vermelhos do sangue). Quando o assunto é a patologia, as disfunções mitocondriais podem causar doenças a qualquer orgão, em qualquer idade, e “algumas delas são tão recentes que ainda não estão descritas em livros ou na literatura médica.” Dra. Paula cita como exemplos do mal funcionamento dessas organelas alguns tipos de cânceres, o diabetes do tipo 2 e outros sintomas como ainfertilidade e a cegueira.
Pessoas entrando em combustão no teatro "Carnegie Hall"
Agora vamos aos principais pontos do jogo que fizeram o assunto ser tão prestigiado na época. O primeiro deles é a cena de abertura, quando pessoas de uma peça de teatro começam a pegar fogo por si próprias. De acordo com o cientista Hans Klamp (personagem do jogo), isso é possível pois a energia liberada por uma mitocôndria, se manifestada ao mesmo tempo por todas presentes em um único corpo, pode gerar efeitos como combustão ou descargas elétricas altíssimas. A Dra. Pauladesmente totalmente essa teoria em poucas palavras: “É pura ficção científica. Não há evidências na literatura científica que descrevam este fenômeno”.
1-Rato normal -> 2-Células normais -> 3-Células possuídas pelas mitocôndrias -> 4-Rato transformado
Outro ponto marcante do jogo é que os seres vivos sofrem mutações, tornando-se grandes gelatinas de proteína ou mesmo monstros como o rato da foto acima. Novamente, supostamente culpa das mitocôndrias, e novamente, desmentido: “Não, istonão é possível de nenhuma forma”.
Mitocôndrias atacando um núcleo celular
Para Klamp, as mitocôndrias sofrem mutações dez vezes mais rápidas que qualquer célula. Isto é, novamente, restrito apenas ao universo do jogo. “Não. É importante salientar que a mitocôndria é uma organela e não uma célula completa. O que ocorre é que o DNA mitocondrial é mais susceptível à sofrer mutações quando comparado ao DNA nuclear.”, explica a bioquímica.
Então isso significa que o surgimento de uma “Eve”, ou seja, mitocôndrias autônomas e superevoluídas, é improvável? Parece que sim. “A mitocôndria é uma das várias organelas que compõem uma célula e existe uma cooperação mútua mitocôndria-célula.” Ou seja, da mesma forma que a célula depende da mitocôndria para a respiração celular e outras funções, a mitocôndria depende do núcleo celular para geração de proteínas mitocondriais. ”Assim, é impossível que umamitocôndria ganhe autonomia o suficiente para se “rebelar” contra a célula onde está hospedada, e adquira toda a informação genética que precisaria para ser capaz de se auto-replicar fora da célula.” explica a Dra. Paula.
Mas será que não existe uma possibilidade da mitocôndria ser possuída por outro ser ou vírus? Nossa entrevistada responde“Não que eu saiba”, mas diz também que “a mitocôndria pode sofrer mutações no seu DNA (DNA mitocondrial) e, quando essas mutações atingem níveis não compatíveis com o funcionamento normal dessa organela, isto pode desencadear algumascondições patológicas.“
Pois bem, só em pesadelos e games
Apesar da última afirmação dar “esperanças” para algo extraordinário em relação às mitocôndrias, ficou mais do que claro queParasite Eve é muito mais fantasioso do que parecia ser. Prova de que seu universo é muito bem detalhado e construído, e de que a humanidade ainda está longe de possuir uma ameaça sobrenatural.
Peço desculpas por estragar a infância/adolescência de muitos leitores com essa reportagem desmistificadora. Não, caros, o apocalipse (ainda?) não vai chegar!
OBS: Se você tiver idéias para o próximo “Beyond Control”, fique a vontade para sugerir nos comentários!
OBS2: Se você perdeu o primeiro episódio, aqui está:
http://www.oplayer2.com.br/beyond-control-episodio-1-the-last-of-us-e-o-apocalipse-fungi/
FONTES, CURIOSIDADES E CRÉDITOS:
Análise de Parasite Eve (videogame):
http://jogadorpensante.com/2011/03/04/epoch-the-time-machine-parasite-eve/
Site oficial do autor Hideaki Sena: http://www.senahideaki.com/
Fotos in-game: Captura
Imagens:
http://www.maxisciences.com/parasite/wallpaper (logo)
http://www.excite.co.jp/News/reviewbook/20110328/E1301152398677.html (capa do livro)
http://www.amazon.co.jp/exec/obidos/ASIN/4048728628/senahideakipa-22 (foto de Hideaki Sena)
